terça-feira, 18 de junho de 2013

RETRATOS de MINHA INFÂNCIA - I

A Colcha de Retalhos

 A colcha de retalhos, cosida pela minha mãe,
Protegia-me do frio e das muriçocas impertinentes.
Era uma belíssima peça artesanal.
 
Logo após acordar, enroupado apenas com um calção,
Também cosido com sobras de tecido,
Corria a inspecionar meus tesouros,
Frascos vazios de desodorante (que logo se transformariam em robôs lúdicos).

- Venha tomar café menino!
Bradava minha mãe.

À mesa, jogava migalhas de pão ao senhor Jhones.
(meu amigo imaginário que morava na companhia de dois leões sob a mesa de jantar).

Do lado de fora, no quintal,
Punha-me a fabricar mais bonecos.
Agora produzidos com cabos de vassouras velhas e tábuas recolhidas de caixotes de madeira.

À tarde montado em meu alazão, (uma velha vassoura de piaçava).
Rodeava o tanque, (reserva d’água, privilégio de poucos na Vila Cardeal e Silva).
Transpondo os obstáculos da pista de hipismo, que eu mesmo montara.
Competia, com adversários fabulosos, até o entardecer.

- Venha tomar banho menino!
Ralhava minha mãe novamente.

Embaixo do chuveiro travava sôfregas batalhas, munido com minha pistola a laser.
(Outro frasco vazio de desodorante).
Como eram úteis esses frascos.

À noite, após o jantar,
Entrava em minha nave espacial.
(Um velho banco de madeira, habilmente construído por meu pai).
Dispunha o banco de cabeça para baixo,
Fechava as laterais com um lençol,
E através de comandos “sofisticados”,
(Tampas de garrafas pregadas no tamborete),
Partia em audaciosas jornadas.
 
Após um pouso preciso, dada a grande perícia do piloto, e exausto de tantas aventuras.
Mergulhava em minha cama e me deixava envolver no aconchego
De minha velha e colorida colcha de retalhos.

 Autor: Sérgio Ricardo

 

Um comentário:

Miriam Correia de Albuquerque disse...

Mais um texto lindo! Que venham muito mais, e que em algum eu esteja presente... Será que consigo esse presente? Beijos.